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Buscas Domiciliares sem Mandado e PrisĂ”es em Flagrante na JurisprudĂȘncia dos Tribunais Superiores

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  • 7 de jun. de 2022
  • 21 min de leitura

Atualizado: 14 de jun. de 2022


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Confira as principais (e atuais) decisÔes dos Tribunais Superiores a respeito das prisÔes em flagrante decorrentes de buscas domiciliares sem mandado judicial nos casos de crimes permanentes, em especial do tråfico de drogas.


- STF: justa causa: “A entrada forçada em domicĂ­lio sem mandado judicial sĂł Ă© lĂ­cita, mesmo em perĂ­odo noturno, quando amparada em fundadas razĂ”es, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados”.[1]


- STJ: fundadas razĂ”es e justa causa: necessidade de anĂĄlise objetiva e satisfatĂłria do contexto fĂĄtico: “1. O ingresso forçado em domicĂ­lio sem mandado judicial para busca e apreensĂŁo Ă© legĂ­timo se amparado em fundadas razĂ”es, devidamente justificadas pelas circunstĂąncias do caso concreto, especialmente nos crimes de natureza permanente, como sĂŁo o trĂĄfico de entorpecentes e a posse ilegal de arma de fogo. 2. Afere-se a justa causa para o ingresso forçado em domicĂ­lio mediante a anĂĄlise objetiva e satisfatĂłria do contexto fĂĄtico anterior Ă  invasĂŁo, considerando-se a existĂȘncia ou nĂŁo de indĂ­cios mĂ­nimos de situação de flagrante no interior da residĂȘncia”.[2]


- STJ: caso paradigmåtico: direito à inviolabilidade domiciliar e limitaçÔes à atuação policial:

“HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. FLAGRANTE. DOMICÍLIO COMO EXPRESSÃO DO DIREITO À INTIMIDADE. ASILO INVIOLÁVEL. EXCEÇÕES CONSTITUCIONAIS. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. INGRESSO NO DOMICÍLIO. EXIGÊNCIA DE JUSTA CAUSA (FUNDADA SUSPEITA). CONSENTIMENTO DO MORADOR. REQUISITOS DE VALIDADE. ÔNUS ESTATAL DE COMPROVAR A VOLUNTARIEDADE DO CONSENTIMENTO. NECESSIDADE DE DOCUMENTAÇÃO E REGISTRO AUDIOVISUAL DA DILIGÊNCIA. NULIDADE DAS PROVAS OBTIDAS. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. PROVA NULA. ABSOLVIÇÃO. ORDEM CONCEDIDA.

1. O art. 5Âș, XI, da Constituição Federal consagrou o direito fundamental Ă  inviolabilidade do domicĂ­lio, ao dispor que "a casa Ă© asilo inviolĂĄvel do indivĂ­duo, ninguĂ©m nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial".

1.1 A inviolabilidade de sua morada é uma das expressÔes do direito à intimidade do indivíduo, o qual, sozinho ou na companhia de seu grupo familiar, espera ter o seu espaço íntimo preservado contra devassas indiscriminadas e arbitrårias, perpetradas sem os cuidados e os limites que a excepcionalidade da ressalva a tal franquia constitucional exige.

1.2. O direito à inviolabilidade de domicílio, dada a sua magnitude e seu relevo, é salvaguardado em diversos catålogos constitucionais de direitos e garantias fundamentais. Célebre, a propósito, a exortação de Conde Chatham, ao dizer que: "O homem mais pobre pode em sua cabana desafiar todas as forças da Coroa. Pode ser frågil, seu telhado pode tremer, o vento pode soprar por ele, a tempestade pode entrar, a chuva pode entrar, mas o Rei da Inglaterra não pode entrar!" ("The poorest man may in his cottage bid defiance to all the forces of the Crown. It may be frail, its roof may shake, the wind may blow through it, the storm may enter, the rain may enter, but the King of England cannot enter!" William Pitt, Earl of Chatham. Speech, March 1763, in Lord Brougham Historical Sketches of Statesmen in the Time of George III First Series (1845) v. 1).

2. O ingresso regular em domicĂ­lio alheio, na linha de inĂșmeros precedentes dos Tribunais Superiores, depende, para sua validade e regularidade, da existĂȘncia de fundadas razĂ”es (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questĂŁo. É dizer, apenas quando o contexto fĂĄtico anterior Ă  invasĂŁo permitir a conclusĂŁo acerca da ocorrĂȘncia de crime no interior da residĂȘncia - cuja urgĂȘncia em sua cessação demande ação imediata - Ă© que se mostra possĂ­vel sacrificar o direito Ă  inviolabilidade do domicĂ­lio.

2.1. Somente o flagrante delito que traduza verdadeira urgĂȘncia legitima o ingresso em domicĂ­lio alheio, como se infere da prĂłpria Lei de Drogas (L. 11.343/2006, art. 53, II) e da Lei 12.850/2013 (art. 8Âș), que autorizam o retardamento da atuação policial na investigação dos crimes de trĂĄfico de entorpecentes, a denotar que nem sempre o carĂĄter permanente do crime impĂ”e sua interrupção imediata a fim de proteger bem jurĂ­dico e evitar danos; Ă© dizer, mesmo diante de situação de flagrĂąncia delitiva, a maior segurança e a melhor instrumentalização da investigação - e, no que interessa a este caso, a proteção do direito Ă  inviolabilidade do domicĂ­lio - justificam o retardo da cessação da prĂĄtica delitiva.

2.2. A autorização judicial para a busca domiciliar, mediante mandado, Ă© o caminho mais acertado a tomar, de sorte a se evitarem situaçÔes que possam, a depender das circunstĂąncias, comprometer a licitude da prova e, por sua vez, ensejar possĂ­vel responsabilização administrativa, civil e penal do agente da segurança pĂșblica autor da ilegalidade, alĂ©m, Ă© claro, da anulação - amiĂșde irreversĂ­vel - de todo o processo, em prejuĂ­zo da sociedade.

3. O Supremo Tribunal Federal definiu, em repercussĂŁo geral (Tema 280), a tese de que: "A entrada forçada em domicĂ­lio sem mandado judicial sĂł Ă© lĂ­cita, mesmo em perĂ­odo noturno, quando amparada em fundadas razĂ”es, devidamente justificadas a posteriori" (RE n. 603.616/RO, Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJe 8/10/2010). Em conclusĂŁo a seu voto, o relator salientou que a interpretação jurisprudencial sobre o tema precisa evoluir, de sorte a trazer mais segurança tanto para os indivĂ­duos sujeitos a tal medida invasiva quanto para os policiais, que deixariam de assumir o risco de cometer crime de invasĂŁo de domicĂ­lio ou de abuso de autoridade, principalmente quando a diligĂȘncia nĂŁo tiver alcançado o resultado esperado.

4. As circunstĂąncias que antecederem a violação do domicĂ­lio devem evidenciar, de modo satisfatĂłrio e objetivo, as fundadas razĂ”es que justifiquem tal diligĂȘncia e a eventual prisĂŁo em flagrante do suspeito, as quais, portanto, nĂŁo podem derivar de simples desconfiança policial, apoiada, v. g., em mera atitude "suspeita", ou na fuga do indivĂ­duo em direção a sua casa diante de uma ronda ostensiva, comportamento que pode ser atribuĂ­do a vĂĄrios motivos, nĂŁo, necessariamente, o de estar o abordado portando ou comercializando substĂąncia entorpecente.

5. Se, por um lado, prĂĄticas ilĂ­citas graves autorizam eventualmente o sacrifĂ­cio de direitos fundamentais, por outro, a coletividade, sobretudo a integrada por segmentos das camadas sociais mais precĂĄrias economicamente, excluĂ­das do usufruto pleno de sua cidadania, tambĂ©m precisa sentir-se segura e ver preservados seus mĂ­nimos direitos e garantias constitucionais, em especial o de nĂŁo ter a residĂȘncia invadida e devassada, a qualquer hora do dia ou da noite, por agentes do Estado, sem as cautelas devidas e sob a Ășnica justificativa, nĂŁo amparada em elementos concretos de convicção, de que o local supostamente seria, por exemplo, um ponto de trĂĄfico de drogas, ou de que o suspeito do trĂĄfico ali se homiziou.

5.1. Em um paĂ­s marcado por alta desigualdade social e racial, o policiamento ostensivo tende a se concentrar em grupos marginalizados e considerados potenciais criminosos ou usuais suspeitos, assim definidos por fatores subjetivos, como idade, cor da pele, gĂȘnero, classe social, local da residĂȘncia, vestimentas etc.

5.2. Sob essa perspectiva, a ausĂȘncia de justificativas e de elementos seguros a legitimar a ação dos agentes pĂșblicos - diante da discricionariedade policial na identificação de suspeitos de prĂĄticas criminosas - pode fragilizar e tornar Ă­rrito o direito Ă  intimidade e Ă  inviolabilidade domiciliar, a qual protege nĂŁo apenas o suspeito, mas todos os moradores do local.

5.3. Tal compreensĂŁo nĂŁo se traduz, obviamente, em cercear a necessĂĄria ação das forças de segurança pĂșblica no combate ao trĂĄfico de entorpecentes, muito menos em transformar o domicĂ­lio em salvaguarda de criminosos ou em espaço de criminalidade. HĂĄ de se convir, no entanto, que sĂł justifica o ingresso policial no domicĂ­lio alheio a situação de ocorrĂȘncia de um crime cuja urgĂȘncia na sua cessação desautorize o aguardo do momento adequado para, mediante mandado judicial - meio ordinĂĄrio e seguro para o afastamento do direito Ă  inviolabilidade da morada - legitimar a entrada em residĂȘncia ou local de abrigo.

6. JĂĄ no que toca ao consentimento do morador para o ingresso em sua residĂȘncia - uma das hipĂłteses autorizadas pela Constituição da RepĂșblica para o afastamento da inviolabilidade do domicĂ­lio - outros paĂ­ses trilharam caminho judicial mais assertivo, ainda que, como aqui, nĂŁo haja normatização detalhada nas respectivas ConstituiçÔes e leis, geralmente limitadas a anunciar o direito Ă  inviolabilidade da intimidade domiciliar e as possĂ­veis autorizaçÔes para o ingresso alheio.

6.1. Nos Estados Unidos, por exemplo, a par da necessidade do exame da causa provĂĄvel para a entrada de policiais em domicĂ­lio de suspeitos de crimes, nĂŁo pode haver dĂșvidas sobre a voluntariedade da autorização do morador (in dubio libertas). O consentimento "deve ser inequĂ­voco, especĂ­fico e conscientemente dado, nĂŁo contaminado por qualquer truculĂȘncia ou coerção ("consent, to be valid, 'must be unequivocal, specific and intelligently given, uncontaminated by any duress or coercion'"). (United States v McCaleb, 552 F2d 717, 721 (6th Cir 1977), citando Simmons v Bomar, 349 F2d 365, 366 (6th Cir 1965). AlĂ©m disso, ao Estado cabe o ĂŽnus de provar que o consentimento foi, de fato, livre e voluntariamente dado, isento de qualquer forma, direta ou indireta, de coação, o que Ă© aferĂ­vel pelo teste da totalidade das circunstĂąncias (totality of circumstances).

6.2. No direito espanhol, por sua vez, o Tribunal Supremo destaca, entre outros, os seguintes requisitos para o consentimento do morador: a) deve ser prestado por pessoa capaz, maior de idade e no exercĂ­cio de seus direitos; b) deve ser consciente e livre; c) deve ser documentado; d) deve ser expresso, nĂŁo servindo o silĂȘncio como consentimento tĂĄcito.

6.3. Outrossim, a documentação comprobatĂłria do assentimento do morador Ă© exigida, na França, de modo expresso e mediante declaração escrita Ă  mĂŁo do morador, conforme norma positivada no art. 76 do CĂłdigo de Processo Penal; nos EUA, tambĂ©m Ă© usual a necessidade de assinatura de um formulĂĄrio pela pessoa que consentiu com o ingresso em seu domicĂ­lio (North Carolina v. Butler (1979) 441 U.S. 369, 373; People v. Ramirez (1997) 59 Cal.App.4th 1548, 1558; U.S. v. Castillo (9a Cir. 1989) 866 F.2d 1071, 1082), declaração que, todavia, serĂĄ desconsiderada se as circunstĂąncias indicarem ter sido obtida de forma coercitiva ou houver dĂșvidas sobre a voluntariedade do consentimento (Haley v. Ohio (1947) 332 U.S. 596, 601; People v. Andersen (1980) 101 Cal.App.3d 563, 579.

6.4. Se para simplesmente algemar uma pessoa, jĂĄ presa - ostentando, portanto, alguma verossimilhança do fato delituoso que deu origem a sua detenção -, exige-se a indicação, por escrito, da justificativa para o uso de tal medida acautelatĂłria, seria entĂŁo, no tocante ao ingresso domiciliar, "necessĂĄrio que nĂłs estabeleçamos, desde logo, como fizemos na SĂșmula 11, alguma formalidade para que essa razĂŁo excepcional seja justificada por escrito, sob pena das sançÔes cabĂ­veis" (voto do Min. Ricardo Lewandowski, no RE n. 603.616/TO). 6.5. Tal providĂȘncia, aliĂĄs, jĂĄ Ă© determinada pelo art. 245, § 7Âș, do CĂłdigo de Processo Penal - analogicamente aplicĂĄvel para busca e apreensĂŁo tambĂ©m sem mandado judicial - ao dispor que, "[f]inda a diligĂȘncia, os executores lavrarĂŁo auto circunstanciado, assinando-o com duas testemunhas presenciais, sem prejuĂ­zo do disposto no § 4Âș".

7. SĂŁo frequentes e notĂłrias as notĂ­cias de abusos cometidos em operaçÔes e diligĂȘncias policiais, quer em abordagens individuais, quer em intervençÔes realizadas em comunidades dos grandes centros urbanos. É, portanto, ingenuidade, academicismo e desconexĂŁo com a realidade conferir, em tais situaçÔes, valor absoluto ao depoimento daqueles que sĂŁo, precisamente, os apontados responsĂĄveis pelos atos abusivos. E, em um paĂ­s conhecido por suas prĂĄticas autoritĂĄrias - nĂŁo apenas histĂłricas, mas atuais -, a aceitação desse comportamento compromete a necessĂĄria aquisição de uma cultura democrĂĄtica de respeito aos direitos fundamentais de todos, independentemente de posição social, condição financeira, profissĂŁo, local da moradia, cor da pele ou raça.

7.1. Ante a ausĂȘncia de normatização que oriente e regule o ingresso em domicĂ­lio alheio, nas hipĂłteses excepcionais previstas no Texto Maior, hĂĄ de se aceitar com muita reserva a usual afirmação - como ocorreu no caso ora em julgamento - de que o morador anuiu livremente ao ingresso dos policiais para a busca domiciliar, mĂĄxime quando a diligĂȘncia nĂŁo Ă© acompanhada de documentação que a imunize contra suspeitas e dĂșvidas sobre sua legalidade.

7.2. Por isso, avulta de importĂąncia que, alĂ©m da documentação escrita da diligĂȘncia policial (relatĂłrio circunstanciado), seja ela totalmente registrada em vĂ­deo e ĂĄudio, de maneira a nĂŁo deixar dĂșvidas quanto Ă  legalidade da ação estatal como um todo e, particularmente, quanto ao livre consentimento do morador para o ingresso domiciliar. Semelhante providĂȘncia resultarĂĄ na diminuição da criminalidade em geral - pela maior eficĂĄcia probatĂłria, bem como pela intimidação a abusos, de um lado, e falsas acusaçÔes contra policiais, por outro - e permitirĂĄ avaliar se houve, efetivamente, justa causa para o ingresso e, quando indicado ter havido consentimento do morador, se foi ele livremente prestado.

8. Ao Poder Judiciårio, ante a lacuna da lei para melhor regulamentação do tema, cabe responder, na moldura do Direito, às situaçÔes que, trazidas por provocação do interessado, se mostrem violadoras de direitos fundamentais do indivíduo. E, especialmente, ao Superior Tribunal de Justiça compete, na sua função judicante, buscar a melhor interpretação possível da lei federal, de sorte a não apenas responder ao pedido da parte, mas também formar precedentes que orientem o julgamento de casos futuros similares.

8.1. As decisĂ”es do Poder JudiciĂĄrio - mormente dos Tribunais incumbidos de interpretar, em Ășltima instĂąncia, as leis federais e a Constituição - servem para dar resposta ao pedido no caso concreto e tambĂ©m para "enriquecer o estoque das regras jurĂ­dicas" (Melvin Eisenberg. The nature of the common law. Cambridge: Harvard University Press, 1998. p. 4) e assegurar, no plano concreto, a realização dos valores, princĂ­pios e objetivos definidos na Constituição de cada paĂ­s. Para tanto, nĂŁo podem, em nome da maior eficiĂȘncia punitiva, tolerar prĂĄticas que se divorciam do modelo civilizatĂłrio que deve orientar a construção de uma sociedade mais igualitĂĄria, fraterna, pluralista e sem preconceitos.

8.2. Como assentado em conhecido debate na Suprema Corte dos EUA sobre a admissibilidade das provas ilĂ­citas (Weeks v. United States, 232 U.S. 383,1914), se os tribunais permitem o uso de provas obtidas em buscas ilegais, tal procedimento representa uma afirmação judicial de manifesta negligĂȘncia, se nĂŁo um aberto desafio, Ă s proibiçÔes da Constituição, direcionadas Ă  proteção das pessoas contra esse tipo de ação nĂŁo autorizada ("such proceeding would be to affirm by judicial decision a manifest neglect, if not an open defiance, of the prohibitions of the Constitution, intended for the protection of the people against such unauthorized action").

8.3. A situação versada neste e em inĂșmeros outros processos que aportam a esta Corte Superior diz respeito Ă  prĂłpria noção de civilidade e ao significado concreto do que se entende por Estado DemocrĂĄtico de Direito, que nĂŁo pode coonestar, para sua legĂ­tima existĂȘncia, prĂĄticas abusivas contra parcelas da população que, por sua topografia e status social e econĂŽmico, costumam ficar mais suscetĂ­veis ao braço ostensivo e armado das forças de segurança.

9. Na espĂ©cie, nĂŁo havia elementos objetivos, seguros e racionais que justificassem a invasĂŁo de domicĂ­lio do suspeito, porquanto a simples avaliação subjetiva dos policiais era insuficiente para conduzir a diligĂȘncia de ingresso na residĂȘncia, visto que nĂŁo foi encontrado nenhum entorpecente na busca pessoa realizada em via pĂșblica.

10. A seu turno, as regras de experiĂȘncia e o senso comum, somadas Ă s peculiaridades do caso concreto, nĂŁo conferem verossimilhança Ă  afirmação dos agentes castrenses de que o paciente teria autorizado, livre e voluntariamente, o ingresso em seu prĂłprio domicĂ­lio, franqueando Ă queles a apreensĂŁo de drogas e, consequentemente, a formação de prova incriminatĂłria em seu desfavor.

11. Assim, como decorrĂȘncia da proibição das provas ilĂ­citas por derivação (art. 5Âș, LVI, da Constituição da RepĂșblica), Ă© nula a prova derivada de conduta ilĂ­cita - no caso, a apreensĂŁo, apĂłs invasĂŁo desautorizada da residĂȘncia do paciente, de 109 g de maconha -, pois evidente o nexo causal entre uma e outra conduta, ou seja, entre a invasĂŁo de domicĂ­lio (permeada de ilicitude) e a apreensĂŁo de drogas.

12. Habeas Corpus concedido, com a anulação da prova decorrente do ingresso desautorizado no domicĂ­lio e consequente absolvição do paciente, dando-se ciĂȘncia do inteiro teor do acĂłrdĂŁo aos Presidentes dos Tribunais de Justiça dos Estados e aos Presidentes dos Tribunais Regionais Federais, bem como Ă s Defensorias PĂșblicas dos Estados e da UniĂŁo, ao Procurador-Geral da RepĂșblica e aos Procuradores-Gerais dos Estados, aos Conselhos Nacionais da Justiça e do MinistĂ©rio PĂșblico, Ă  Ordem dos Advogados do Brasil, ao Conselho Nacional de Direitos Humanos, ao Ministro da Justiça e Segurança PĂșblica e aos Governadores dos Estados e do Distrito Federal, encarecendo a estes Ășltimos que deem conhecimento do teor do julgado a todos os ĂłrgĂŁos e agentes da segurança pĂșblica federal, estadual e distrital.

13. Estabelece-se o prazo de um ano para permitir o aparelhamento das polĂ­cias, treinamento e demais providĂȘncias necessĂĄrias para a adaptação Ă s diretrizes da presente decisĂŁo, de modo a, sem prejuĂ­zo do exame singular de casos futuros, evitar situaçÔes de ilicitude que possam, entre outros efeitos, implicar responsabilidade administrativa, civil e/ou penal do agente estatal”.[4]


- STF (Min. Alexandre de Moraes): restrição à interpretação conferida pelo STJ:

“Ocorre, entretanto, que a 6ÂȘ Turma do Superior Tribunal de Justiça, apĂłs aplicar o Tema 280 de RepercussĂŁo Geral dessa SUPREMA CORTE, foi mais longe, nĂŁo sĂł transformando o presente habeas corpus individual em um habeas corpus coletivo, como tambĂ©m estabelecendo requisitos constitucionalmente inexistentes e determinando em abstrato e com efeitos vinculantes e erga omnes a todos os ĂłrgĂŁos da administração de segurança pĂșblica do PaĂ­s – estaduais, distrital e federal – verdadeira obrigação de fazer inexistente na Constituição Federal e na legislação, como se verifica nos itens 7.2, 12 e 13 da Ementa do referido julgado (...)

Nesse ponto, nĂŁo agiu com o costumeiro acerto o Superior Tribunal de Justiça, pois acrescentou requisitos inexistentes no inciso XI, do artigo 5Âș da Constituição Federal, desrespeitando, dessa maneira, os parĂąmetros definidos no Tema 280 de RepercussĂŁo Geral por essa SUPREMA CORTE” (...)

A natureza desse especĂ­fico recurso constitucional nĂŁo permite a sua utilização de forma abrangente e totalmente genĂ©rica, o que dirĂĄ que as decisĂ”es nele proferidas possuam alcance indiscriminado a todos os processos envolvendo a necessidade de busca domiciliar em caso de flagrante delito, ainda mais com a determinação de implantação obrigatĂłria de medidas nĂŁo previstas em lei e que sĂŁo atinentes Ă  organização administrativa e orçamentĂĄrias dos ĂłrgĂŁos de segurança pĂșblica das unidades federativas (...)

IncabĂ­vel, portanto, na presente hipĂłtese e em sede de habeas corpus individual, ao Poder JudiciĂĄrio determinar ao Poder Executivo o aparelhamento de suas polĂ­cias, assim como o treinamento de seu efetivo e a imposição de providĂȘncias administrativas como medida obrigatĂłria para os casos de busca domiciliar, sob o argumento de serem necessĂĄrias para evitar eventuais abusos, alĂ©m de suspeitas e dĂșvidas sobre a legalidade da diligĂȘncia, em que pese inexistir tais requisitos no inciso XI, do artigo 5Âș da Constituição Federal, nem tampouco no Tema 280 de RepercussĂŁo Geral julgado por essa SUPREMA CORTE.

Diante de todo o exposto, em face do decidido no Tema 280 de RepercussĂŁo Geral, CONHEÇO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO PARA CONCEDER PARCIAL PROVIMENTO E ANULAR O ACÓRDÃO RECORRIDO tĂŁo somente na parte em que entendeu pela necessidade de documentação e registro audiovisual das diligĂȘncias policiais, determinando a implementação de medidas aos ĂłrgĂŁos de segurança pĂșblica de todas as unidades da federação (itens 7,1, 7.2, 8, 12, e 13 da Ementa); MANTENDO, entretanto, a CONCESSÃO DA ORDEM para absolver o paciente, em virtude da anulação das provas decorrentes do ingresso desautorizado em seu domicĂ­lio”.[5]


- injusta causa: denĂșncia anĂŽnima: “Conforme entendimento firmado por esta Corte, a mera denĂșncia anĂŽnima, desacompanhada de outros elementos preliminares indicativos de crime, nĂŁo legitima o ingresso de policiais no domicĂ­lio indicado, estando, ausente, assim, nessas situaçÔes, justa causa para a medida (...) NĂŁo havendo, como na hipĂłtese, outros elementos preliminares indicativos de crime que acompanhem a denĂșncia anĂŽnima, inexiste justa causa a autorizar o ingresso no domicĂ­lio sem o consentimento do morador, o que nulifica a prova produzida”.[6]


- injusta causa: atitude suspeita e fuga da abordagem: “Narram os autos que os policiais, em patrulhamento de rotina, avistaram o paciente em atitude suspeita, tendo corrido para dentro da residĂȘncia (...) NĂŁo foram realizadas investigaçÔes prĂ©vias nem indicados elementos concretos que confirmassem o crime de trĂĄfico de drogas dentro da residĂȘncia, nĂŁo sendo suficiente, por si sĂł, a verificação de atitude suspeita do paciente ou mesmo a sua fuga no momento da abordagem, tampouco a apreensĂŁo da droga em sua posse”.[7]


- justa causa: fuga da abordagem e arremesso de mochila na residĂȘncia: “(...) No caso, durante patrulhamento de ronda, os policiais militares avistaram o recorrente portando uma mochila conversando com uma pessoa dentro de um carro. Ao perceberem a aproximação dos policiais, os agentes empreenderam fuga, tendo o recorrente adentrado sua casa e atirado a mochila para o terreno vizinho. Ao ser alcançado, o recorrente ofereceu resistĂȘncia, ao passo que sua mochila foi recuperada, na qual foram encontrados ‘R$ 15.956,00 (quinze mil, novecentos e cinquenta e seis reais); uma caixa contendo 50 (cinquenta) cartuchos intactos do calibre 5.56 (munição de fuzil); 04 (quatro) balanças de precisĂŁo; anotaçÔes diversas relacionadas ao trĂĄfico de drogas, em 14 (quatorze) folhas; 311 (trezentos e onze) microtubos plĂĄsticos, tipo eppendorf, contendo cocaĂ­na; 252 (duzentos e cinquenta e dois) pedras de crack; 343 (trezentos e quarente e trĂȘs) gramas de cocaĂ­na a granel em uma embalagem; 115 (cento e quinze) gramas de cocaĂ­na em duas embalagem; seis porçÔes menores de cocaĂ­na, que totalizaram 18 (dezoito) gramas; 02 (duas) pochetes vazias; 03 (trĂȘs) rolos de papel filme utilizados em embalagens de drogas e 01 (uma) mĂĄquina de cartĂŁo’ (...) III - Ao contrĂĄrio da sustentação defensiva de que "pouco importam" as atitudes do agravante que ensejaram a atuação policial, reforça-se que, nĂŁo sĂł pela importĂąncia da devida tutela jurisdicional no caso em exame, mas tambĂ©m pela compreensĂŁo mais ampla acerca da formatação social e jurĂ­dica que permeia a sociedade brasileira e das regras de convivĂȘncia que organizam as relaçÔes humanas e sociais, as normas penais e processuais penais tutelam os bens jurĂ­dicos mais importantes e as fundadas suspeitas de prĂĄtica delitiva ensejam, por autorização constitucional, a atuação das forças de segurança que tem, por atribuição da prĂłpria Carta Magna, o dever de proteção e tutela dos bens mais valiosos da sociedade. IV - DaĂ­ a conclusĂŁo de que, ante as circunstĂąncias fĂĄticas anteriores ao ingresso domiciliar, consistentes na fuga e no arremesso da mochila, comportamentos concretos a ensejar fundadas razĂ”es para a atuação policial, com resultado produtivo na captação de flagrante de crime de trĂĄfico de drogas, na posse de variadas formas de apresentação da cocaĂ­na, alĂ©m de petrechos do comĂ©rcio espĂșrio, muniçÔes e expressiva quantia em dinheiro, nĂŁo se afasta a legalidade da mitigação da inviolabilidade de domicĂ­lio e da escorreita atuação policial”.[8]


- injusta causa: apreensĂŁo de drogas fora da residĂȘncia: “(...) 2. As instĂąncias ordinĂĄrias concluĂ­ram que os agentes pĂșblicos tinham fundadas suspeitas da prĂĄtica de crime na casa do acusado, tendo em vista que os policiais ‘ao visualizarem o suspeito e um adolescente, estes apresentaram ‘acentuado nervosismo’, tendo o ora Paciente dispensado uma sacola ao chĂŁo, e sĂł posteriormente empreenderam fuga para o interior da residĂȘncia. Recolhida a referida sacola, constatou-se conter 15 (quinze) pedras de crack’. 3. PorĂ©m, nĂŁo foram realizadas investigaçÔes prĂ©vias nem indicados elementos concretos que confirmassem o crime de trĂĄfico de drogas dentro da residĂȘncia, nĂŁo sendo suficiente, por si sĂł, a verificação de atitude suspeita do paciente, seu nervosismo ou mesmo seu comportamento no momento da abordagem, tampouco a apreensĂŁo de pequena quantidade de droga em sua posse ou apĂłs ser dispensada ao chĂŁo, como na espĂ©cie. 4. Boa parte da droga apreendida deve ser considerada como fruto de prova ilegal, haja vista a invasĂŁo de domicĂ­lio. Como a quantidade remanescente Ă© modesta, e tendo em conta que, mesmo que nĂŁo houvesse ilegalidade na apreensĂŁo realizada sem ordem judicial, ainda assim haveria infundadas razĂ”es para a prisĂŁo (a quantidade e a variedade de drogas sĂŁo elementares do tipo penal imputado), nĂŁo deve subsistir a cautelar mĂĄxima. 5. Assim postos os fatos, Ă© de se conceder em parte o habeas corpus, para declarar a nulidade da apreensĂŁo de drogas realizada na residĂȘncia do recorrente, devendo as provas decorrentes dessa apreensĂŁo ser descartadas (desconsideradas), mantendo-se apenas, para a sequĂȘncia da persecução penal, a apreensĂŁo dos objetos dispensados na rua no momento da abordagem policial”.[9]


- injusta causa: meras denĂșncias anĂŽnimas e comportamento suspeito do imputado em fuga: “Tendo como referĂȘncia o recente entendimento firmado por esta Corte, nos autos do HC n. 598.051/SP, o ingresso policial forçado em domicĂ­lio, mesmo resultando na apreensĂŁo de arma de fogo e duas barras grandes e prensadas de substĂąncia anĂĄloga Ă  maconha e 23 (vinte e trĂȘs) pedras de crack, quando apoiado em meras denĂșncias anĂŽnimas e no comportamento suspeito do acusado, que empreendeu fuga no momento da abordagem, nĂŁo traz contexto fĂĄtico que justifica a dispensa de investigaçÔes prĂ©vias ou do mandado judicial para a entrada dos agentes pĂșblicos na residĂȘncia, acarretando a nulidade da diligĂȘncia policial, como no caso dos autos”.[10]


- justa causa: denĂșncia anĂŽnima e comportamento do suspeito na residĂȘncia: “(...) Na hipĂłtese, o contexto fĂĄtico delineado nos autos evidenciou existirem fundadas suspeitas para que a autoridade policial realizasse a vistoria no imĂłvel, tendo em vista a denĂșncia anĂŽnima que havia indicado, com precisĂŁo e riqueza de detalhes, o endereço em que estariam sendo comercializados os entorpecentes, aliada ao fato de que os policiais civis, do lado de fora da casa, chamaram o nome de um dos agravantes, o qual saiu no corredor e, ao perceber a presença policial, gritou as seguintes palavras: ‘Molhou! Molhou! Joga fora’. Diante da fundada suspeita, os policiais adentraram ao imĂłvel e surpreenderam o agravante Felipe, no banheiro, quando dispensava parte da droga no vaso sanitĂĄrio, e localizaram o agravante Marcos, no Ășltimo quarto do imĂłvel, no qual havia mais drogas e petrechos usados no fracionamento e embalo de entorpecentes. Havia, portanto, elementos objetivos e racionais que justificaram o ingresso da polĂ­cia em domicĂ­lio alheio, sem autorização judicial, oportunidade na qual foram encontradas 90 porçÔes de crack e 226 porçÔes de cocaĂ­na.”.[11]


- justa causa: denĂșncia anĂŽnima, fuga da abordagem e arremesso de sacola na residĂȘncia: “(...) No caso concreto, a fundada suspeita dos policiais residiu no fato de que havia prĂ©via denĂșncia anĂŽnima sobre a atividade criminosa dos autos (...) In casu, havia prĂ©via denĂșncia anĂŽnima sobre indivĂ­duos praticando trĂĄfico de drogas nas proximidades de uma igreja evangĂ©lica, localizada em ĂĄrea dominada pela facção criminosa denominada ‘Terceiro Comando’. ApĂłs a tentativa de abordagem policial em via pĂșblica, o paciente e seu comparsa empreenderam fuga para uma residĂȘncia prĂłxima. Da residĂȘncia, arremessaram uma sacola com drogas pela janela, o que foi visto pelos policiais ainda de fora, momento em que apreenderam as drogas na parte externa da residĂȘncia, tudo, conforme assentado no v. acĂłrdĂŁo. Destaca-se que ainda houve a confissĂŁo informal do paciente e de seu comparsa nesse momento, acerca de terem migrado para a facção criminosa acima. Ademais, as drogas efetivamente apreendidas (27g de maconha, distribuĂ­dos em 14 plĂĄsticos transparentes) somente reforçaram a necessidade da atuação estatal”.[12]


- justa causa: visualização da substĂąncia entorpecente no interior da casa: “(...) No caso dos autos, os agentes policiais, apĂłs denĂșncia anĂŽnima, se deslocaram atĂ© a residĂȘncia do recorrente e passaram a monitorar o local. Neste momento, os agentes avistaram as substĂąncias entorpecentes no corredor do imĂłvel e ingressaram, apreendendo as drogas e efetuando a prisĂŁo do recorrente. Nesse contexto, a conclusĂŁo acerca da ocorrĂȘncia do crime, anterior ao ingresso na residĂȘncia, configurando a situação de flagrĂąncia, permite a flexibilização do direito Ă  inviolabilidade do domicĂ­lio, nĂŁo havendo falar em ilegalidade das provas obtidas durante a ocorrĂȘncia policial”.[13]


- justa causa: forte odor de droga vindo do interior da residĂȘncia: “1. Conforme observado pelas instĂąncias anteriores, os policiais, apĂłs notĂ­cias de que no local ocorria o trĂĄfico de substĂąncias ilĂ­citas, realizaram prĂ©via campana de 10 minutos, quando sentiram forte odor de maconha na frente da casa do acusado, motivo que os fez adentrar e efetuar o flagrante. 2. TambĂ©m foi constatado pelos investigadores a plantação de maconha no local, consignando-se que ‘Era relevante e complexa a cultura da droga na casa. Foram apreendidos fertilizantes e lĂąmpadas’, o que pode justificar o cheiro do entorpecente que exalava da casa. Nesse sentido, em casos semelhantes, a jurisprudĂȘncia desta Corte Ă© no sentido de autorizar o ingresso dos milicianos.”.[14]


- licitude: diligĂȘncia policial originada por atividade de inteligĂȘncia policial militar: “3. Investigação policial originada de informaçÔes obtidas por inteligĂȘncia policial e mediante diligĂȘncias prĂ©vias que redunda em acesso Ă  residĂȘncia do acusado nĂŁo se traduz em constrangimento ilegal, mas sim em exercĂ­cio regular da atividade investigativa promovida pelas autoridades policiais”.[15]



Leonardo Marcondes Machado é delegado de polícia em Santa Catarina, doutorando e mestre em Direito pela Universidade Federal do Paranå, pós-graduado em Raciocínio Probatório pela Universidade de Girona (Espanha), bem como especialista em Direito Penal e Criminologia pelo ICPC. Professor em cursos de graduação e pós-graduação (www.leonardomarcondesmachado.com.br).


------------------------ [1] “Recurso extraordinĂĄrio representativo da controvĂ©rsia. RepercussĂŁo geral. 2. Inviolabilidade de domicĂ­lio – art. 5Âș, XI, da CF. Busca e apreensĂŁo domiciliar sem mandado judicial em caso de crime permanente. Possibilidade. A Constituição dispensa o mandado judicial para ingresso forçado em residĂȘncia em caso de flagrante delito. No crime permanente, a situação de flagrĂąncia se protrai no tempo. 3. PerĂ­odo noturno. A clĂĄusula que limita o ingresso ao perĂ­odo do dia Ă© aplicĂĄvel apenas aos casos em que a busca Ă© determinada por ordem judicial. Nos demais casos – flagrante delito, desastre ou para prestar socorro – a Constituição nĂŁo faz exigĂȘncia quanto ao perĂ­odo do dia. 4. Controle judicial a posteriori. Necessidade de preservação da inviolabilidade domiciliar. Interpretação da Constituição. Proteção contra ingerĂȘncias arbitrĂĄrias no domicĂ­lio. Muito embora o flagrante delito legitime o ingresso forçado em casa sem determinação judicial, a medida deve ser controlada judicialmente. A inexistĂȘncia de controle judicial, ainda que posterior Ă  execução da medida, esvaziaria o nĂșcleo fundamental da garantia contra a inviolabilidade da casa (art. 5, XI, da CF) e deixaria de proteger contra ingerĂȘncias arbitrĂĄrias no domicĂ­lio (Pacto de SĂŁo JosĂ© da Costa Rica, artigo 11, 2, e Pacto Internacional sobre Direitos Civis e PolĂ­ticos, artigo 17, 1). O controle judicial a posteriori decorre tanto da interpretação da Constituição, quanto da aplicação da proteção consagrada em tratados internacionais sobre direitos humanos incorporados ao ordenamento jurĂ­dico. Normas internacionais de carĂĄter judicial que se incorporam Ă  clĂĄusula do devido processo legal. 5. Justa causa. A entrada forçada em domicĂ­lio, sem uma justificativa prĂ©via conforme o direito, Ă© arbitrĂĄria. NĂŁo serĂĄ a constatação de situação de flagrĂąncia, posterior ao ingresso, que justificarĂĄ a medida. Os agentes estatais devem demonstrar que havia elementos mĂ­nimos a caracterizar fundadas razĂ”es (justa causa) para a medida. 6. Fixada a interpretação de que a entrada forçada em domicĂ­lio sem mandado judicial sĂł Ă© lĂ­cita, mesmo em perĂ­odo noturno, quando amparada em fundadas razĂ”es, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados. 7. Caso concreto. ExistĂȘncia de fundadas razĂ”es para suspeitar de flagrante de trĂĄfico de drogas. Negativa de provimento ao recurso” (STF - Tribunal Pleno - RE 603.616/RO - Rel. Min. Gilmar Mendes - j. em 05.11.2015 – DJe 093 de 09.05.2016). Na mesma linha: STF - Tribunal Pleno - ADPF 635 MC-ED / RJ - Rel. Min. Edson Fachin - j. em 03.02.2022 – DJe 101 de 25.05.2022.

[2] STJ - Quinta Turma - AgRg no HC 734.423/GO - Rel. Min. JoĂŁo OtĂĄvio de Noronha - j. em 24.05.2022 - DJe de 26.05.2022.

[3] STJ - Sexta Turma - HC 598.051/SP - Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz - j. em 02.03.2021 - Info. 687 de 08.03.2021.

[4] STJ - Sexta Turma -HC 598.051/SP - Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz - j. em 02.03.2021–DJe de 15.03.2021.

[5] STF – Decisão Monocrática - RE 1.342.077 - Rel. Min. Alexandre de Moraes – j. em 02.12.2021 - DJe de 06.12.2021.

[6] STJ – Sexta Turma - HC 512.418/RJ - Rel. Min.Nefi Cordeiro – j. em 26.11.2019 - DJe de 03.12.2019. Na mesma linha: “No caso, verifica-se violação do art. 157 do CĂłdigo de Processo Penal, observado que o ingresso forçado na casa onde foram apreendidas as drogas nĂŁo se sustenta em fundadas razĂ”es extraĂ­das da leitura dos documentos dos autos. Isso, porque a diligĂȘncia apoiou-se em meras denĂșncias anĂŽnimas, circunstĂąncia que nĂŁo justifica, por si sĂł, a dispensa de investigaçÔes prĂ©vias ou do mandado judicial. Assim sendo, o contexto fĂĄtico narrado nĂŁo corrobora a conclusĂŁo inarredĂĄvel de que na residĂȘncia praticava-se o crime de trĂĄfico de drogas” (STJ - Sexta Turma - AgRg nos EDcl no HC 707.334/MG - Rel. Min. Antonio Saldanha Pinheiro - j. em 03.05.2022 - DJe de 06.05.2022).

[7] STJ - Sexta Turma - HC 694.509/GO - Rel. Min. Olindo Menezes (Des. Conv. TRF 1ÂȘ RegiĂŁo) - j. em 15.03.2022 - DJe de 21.03.2022.

[8] STJ - Quinta Turma - AgRg no RHC 164.149/SP - Rel. Min. JesuĂ­no Rissato (Des. Conv. TJDFT) - j. em 24.05.2022 - DJe de 31.05.2022.

[9] STJ - Sexta Turma - HC 720.840/ES - Rel. Min. Olindo Menezes (Des. Conv. TRF 1ÂȘ RegiĂŁo) - j. em 17.05.2022 - DJe de 20.05.2022.

[10] STJ - Sexta Turma - AgRg no HC 593.798/MG - Rel. Min. Antonio Saldanha Pinheiro - j. em 24.05.2022 - DJe de 27.05.2022.

[11] STJ - Quinta Turma - AgRg no HC 741.190/SP- Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca - j. em 24.05.2022 - DJe de 30.05.2022.

[12] STJ - Quinta Turma - HC 719.748/RJ - Rel. Min. JesuĂ­no Rissato (Des. Conv. TJDFT) - j. em 24.05.2022 - DJe de 30.05.2022.

[13] STJ - Quinta Turma - AgRg no REsp 1.896.154/MG- Rel. Min. Joel Ilan Paciornik - j. em 09.02.2021- DJe de 17.02.2021.

[14] STJ -Sexta Turma - AgRg no HC 711.424/SP- Rel. Min. Olindo Menezes (Des. Conv. TRF 1ÂȘ RegiĂŁo) - j. em 17.05.2022- DJe de 20.05.2022.

[15] STJ - Quinta Turma - AgRg no HC 734.423/GO - Rel. Min. JoĂŁo OtĂĄvio de Noronha - j. em 24.05.2022 - DJe de 26.05.2022.

 
 
 

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